sexta-feira, março 25, 2011

O Grande Retorno

O sol estava claro naquele dia de verão calmo e tranquilo. De forma pacata, algumas aves voavam pelos céus, felizes e contentes em simplesmente estarem voando. Diante de mim um lago situava-se, plácido e inquietantemente belo. Resplandecia ao lado de meu banco uma bela mulher de cabelos escuros e olhos verdes como as folhas de uma árvore na primavera. Toda a cena era tão irritantemente quieta e pacífica, que, de fato, eu encontrei-me aliviado quando o Sandro apareceu, atirando uma metralhadora que ele havia conseguido Bob sabe aonde para tudo quanto é lado. Ódio puro e irreprimível latejava como lava de seus olhos, enquanto ele se entretia atirando em pássaros. Toda vez que ele matava um, ria feito um garoto que acaba de ganhar uma bicicleta nova. E toda vez que errava, ele atirava na direção de algum transeunte desafortunado. Uns bons quinze minutos se passaram assim, até que ele viu-me, deitado no chão e protegendo a cabeça.

— Victor! — ele chamou meu nome, balançando a arma. Talvez seja uma hora decente para se descrever o que ele vestia que tornou tal cena tão inapropriada: Uma faixa na cabeça estilo Rambo, e absolutamente nada além disso — Te encontrei!
— Sandro! — tentei disfarçar o terror absoluto em minha voz. Quando se passa algum tempo entre pessoas normais, tende-se a desacostumar-se a pessoas completamente insanas como o Sandro — Como você vai?
— Vou bem, vou bem — ele parecia absurdamente feliz, como um cachorro que encontrou o dono — um cachorro com uma faixa vermelha na cabeça e uma metralhadora em suas patas — e você, como vai?
— Vou bem, também.
— Escute, eu sei que tem algum tempo que não nos falamos, especialmente depois daquela bobeira sobre a buceta da Dilma, mas… Você quer ver um filme?
— Bem, eu estava com uma acompanhante… — apontei para a garota que, neste momento, chorava o nome de sua mãe sob o banco no qual outrora nos sentávamos, e ouvi imediatamente um “Seu cachorro!” do meu velho companheiro — mas tá, por que não?

Seguimos até o cinema mais próximo, e toda vez que algum pedestre notava ou minha total ausência de caráter ou a total ausência de roupas do Sandro, ele a ameaçava com o rifle dele — ou era uma metralhadora. Sou péssimo com armas. Chegamos na bilheteria, e o Sandro deu uma nota de vinte reais para o homem que ele não ousou tocar. Recusando-se o dinheiro, ele guardou novamente a nova sabe-se Bob aonde e entramos, nossas morais já nos permitindo isso — afinal, tentamos pagar pelo cinema, e eles simplesmente não permitiram! —, e pegamos assentos num dos filmes que estava passando — imagino eu que tenha sido Cisne Negro, um filme tão desprezado por minha pessoa que havia de vê-lo duas vezes.

— Então… — Sandro começou, lágrimas já em seus olhos. Apesar do homoerotismo implicado, ele, eu, e o Fabiano que chegou ali inesperadamente, éramos todos machos extremamente machudos e machados. E sim, eu li essa frase. Continuando: — como tem sido sua vida fora da Nave?

Ah, sim… A Nave da Loucura, o pequeno experimento de Sandro para tentar tornar a sociedade um lugar ainda mais indecente e depravado. Lembro-me que havia participado até o segundo ou terceiro ano daquela malfadada experiência, quando subitamente fui “Forçado a sair” por motivos de ter falado mal da buceta da Dilma. Liberdade de expressão pode morder meu traseiro.

— Vai indo bem, Sandro — respondi-lhe sem nem um pingo de emoção. Também estava sem um pinho de emoção, mas o pinho, sendo uma coisa bastante esquisita, não merece menção maior do que esta que estou lhe reservando, e portanto deixará de ser mencionado em 3… 2… 1…
— Mas eu poderia estar indo melhor. Como vai a Nave?
— Excelentemente bem. Agora temos uma escritora mulher.
— Ah. Isso deve ser interessante.
— E é.
— U-huh.
— Yup.
— Cornucópia — disse Fabiano de repente, sem qualquer motivo ou convite.
— Então, escuta… Você quer voltar para o Nave?
— Não sei, Sandro. Faz tempo que não escrevo algo político. Acho que perdi o dom. Sem contar que eu fui censurado. E eu não esqueço censuras.
— Por favor! Nós precisamos de você! As orgias perderam a graça sem suas piadinhas retardadas, e a nova escritora sempre nos olha feio quando bebemos detergente do balde!
— Ela olha feio quando bebemos detergente do balde?! — neste ponto, eu só estava rindo-me dele. Jamais voltaria à Nave. Apesar de ter vivido uns dos melhores momentos da minha vida lá, bebendo detergente de baldes e participando de orgias com cabras, mulheres que cobram por hora e homens com bigodes chamados “Sally” — os bigodes, não os homens —, eu jamais poderia voltar. Aquele capítulo da minha vida estava acabado.
— Nós deixamos você escrever sobre a buceta da Dilma.
— Estou dentro. — Apertamos mãos — ou pelo menos eu espero que tenha sido a mão dele. Como que para celebrar nossa alegria, um policial apareceu e prendeu-nos, e eu não poderia estar mais feliz. Estava até sentindo falta da cadeia.

Então, sabe como é. Victor Biancardine is back, baby, and has he got a surprise for you!

Um comentário:

  1. Sim, isto é uma obra de ficção! Eu não estava bêbado, nem paranóico (paranóico sim, mas sem motivo aparente)!

    ResponderExcluir

Abre teu coração e chora!